Sunday, December 18, 2005


Auto-retrato
(Luz... Porto)

Um rosto assimétrico. Não poderia ser diferente. Cabelos curtos numa tentativa de recuperar os seus nove ou dez anos de idade, quando ainda pensava que haveria esperança, mas que se perderam no sumidouro inexorável do tempo. Os raríssimos fios brancos já teimam em aparecer. Um pouco de ballaiage não faz mal. Afinal fora claro na infância. Os olhos castanhos até sorriem por trás dos óculos Marília Gabriela. Num segundo exame, contudo, parecem negros como um poço sem fundo, como a solidão das noites eternas. O nariz, ah o nariz, que sempre fora tão elogiado, permanece o mesmo, assim como a boca carnuda que agora pinta de encarnado com orgulho. O pescoço londo é cercado por uma inevitável gargantilha prestes a sufocá-la. Estranho esse fascínio por gargantilhas... Ela, chegada a uma falta de ar, respira bem e livre dentro de uma coleira. Das orelhas pendem brincos. Longos e coloridos como se tentassem alongar os cabelos em peruca de pérolas. A expressão se ameiga embora o rosto já exiba as linhas de um destino que cumprira, mas não escolhera. Na testa, escondida pela franja, o eterno franzir a perguntar: "Por quê?", "Quem?", "Como?", "Para quê?"...

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