Sunday, December 18, 2005


NOCTÍVAGA Nº 2
(Luz... Porto)
Três da madrugada...
Vagueio pela casa
Qual Nosferatu insone.
As luzes apagadas
Contrastam com a luz esmaecida e pálida
Que penetra pelas cortinas puídas
E formam espectros na parede branca,
No teto empoeirado
E no chão de tacos
Onde cera de vela se acumula.
Esbarro em móveis desproporcionais
À sala.
Móveis usados, reaproveitados
De casas desterradas,
Exiladas em Praga, Viena, Quênia, Baviera.
O mármore sem vida
De minha pele exangüe
Enche-se de manchas roxas.
Roxas como minhas olheiras,
Óculos de segunda pele.
Vislumbro a mesa de centro
Apinhada de CDs
Cujas capas não consigo distinguir,
Restos de pétalas mortas
E cinzas de incenso já usado
Misturam-se ao olor
De velas perfumadas
Queimadas à tarde.
Súbito minha alma esbarra na tua, distraída,
Na cozinha, em meio à tábua de passar,
À geladeira e ao fogão.
Não me disseste que virias visitar-me.
Não sabia que tu, criatura da luz, de hábitos diurnos
Também sonambulavas errante
E te dirigias, célere,
A outros espaços
Só para poderes me ver
E tocares meu espectro
Em meio à noite eterna de nossas existências
Condenadas à clivagem,
Ao hiato, à separação.
Lua e sol.
Eclipse que só, de tempos em tempos,
Permite que as fímbrias das tuas vestes
Rocem, de leve, as minhas...

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