Monday, October 27, 2014

ANDORINHA
(Luz... Porto)
Imagem de Rosemary Oliveira

Ontem eu não dei Bom Dia,
Nem Boa Tarde ou Boa Noite.
Filomela violada por um maldito,
Não me cabe mais a fala.

Hoje não darei Bom Dia,
Nem Boa Tarde ou Boa Noite.
Com um punhal cortaram-me.
Sem língua, só me resta bordar.

E vou tecendo minha triste sina,
Com dedos já feridos por agulhas.
Dedos ágrafos, coração sem voz.
Mas rogo aos deuses surdos

Que minha prece seja ouvida,
Que tenha fim o meu penar.
Que transformem a mim
Em singela andorinha a bailar.

Se as gralhas têm seu grasnar,
Aos cães cabem uivar e latir,
Os gatos sabem miar
Por que ninguém pode me ouvir?

Que pecado terei cometido,
Virgem zelosa na casa do pai?
Vós, Imortais do Olimpo,
De mim não ouviram meus ais.

Assistiram-me a perdição de camarote
Entre ambrosias e néctares sublimes.
Poderíeis ao louco ter destituído
A virilidade com um piparote.

As Moiras são enigmas à parte:
Fiam, tecem, cortam a seu bel-prazer.
Pouco se lhes dá a parca sorte
Do humano que vive a sofrer.

Mas quem sabe o milagre não se dê
À mortal que sempre vive à mercê,
E possa amanhã desejar Bom Dia,
Quiçá, Boa Tarde, quem dera, Boa Noite...

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