Saturday, February 03, 2007

LABIRINTO


LABIRINTO (Luz... Porto)

As portas, que seriam cinco, revelam-se sete. A sétima porta só se cruzaria com a morte. Era preciso vencer o medo, matá-lo para que se obtivesse o que por trás jazia. E o que jazia era o Desejo, ou melhor, a concretização final desse desejo pulsante. Mas como mataríamos o medo sem conquistarmos o que desejamos, aquilo que nos dará forças para matar? Paramos congelados e patéticos nesse paradoxo. E ficamos ali, encruados, gastando toda uma vida, aquela, para vencermos o medo. Na maior parte dos casos não o vencemos. Ele é quem nos vence pelo cansaço.
Há algumas pessoas, não sei se corajosas ou não, que, fascinadas pela idéia do que encontrariam após o portal, tentam dar cabo do medo. Como não têm sucesso, acabam por tirar suas próprias vidas. A Igreja não deixa que seus corpos sejam enterrados em solo sagrado. Não se pode, teoricamente, rezar por suas almas, só no escuro e bem escondido. Nunca soube se elas encontraram o que buscavam. Há os que consideram tal ato hediondo e passível de punição eterna. Há outros, como Bandeira, que lhes apreciam a paixão. Um terceiro grupo os toma por covardes pura e simplesmente.
De minha parte, não sei. Como o Leão de “O Mágico de Oz” nasci desprovida de coragem. É esse o atributo que busco. Mas já intuí que ele não estará atrás da sétima porta. Talvez num cofre, num baú que eu ainda guarde no meu quarto de moça solteira.
Será coragem sucumbir ao Desejo ou resistir ao Desejo? Tentar subjugá-lo, cavalgá-lo, nada mais é que se entregar a ele... Os jesuítas nos ensinaram a fustigar a carne para aplacarmos seus anseios e domarmos nossos demônios. Um Caetano pós-tropicalista concluirá uma de suas mais belas canções com o fecho: “Coragem grande é poder dizer sim”. Sou levada a pensar que dizer sim exige uma coragem dos diabos. Mas dizer sim implicará, necessariamente, abandonar o jogo, pendurar as chuteiras, saltar da Pedra da Gávea sem pára-quedas, voar do oitavo, do vigésimo-quinto andar, atravessando esquadrias sem asas?
Atrás da sétima porta está o saciar do Desejo, o Mistério, a Plenitude. Só que o Mistério, como bem disse Gil,não é nada, nada, nada do que pensávamos encontrar. É o Icognoscível, o Imponderável, o Inatingível, o Insustentável, o Intraduzível.
Atrás do sétimo portal, tememos, pode se encontrar uma duplicata da vida, dessa mesma droga de vida que levamos na terra. Pode ser uma ironia do Criador que tenta nos despertar a consciência, fazendo-nos girar indefinidamente pelos mesmos labirintos enquanto batemos a cabeça nos mesmos muros, quase nos matamos pelas mesmas paixões equivocadas e brigamos com quem deveríamos ter como aliados.
Atrás da sétima porta, tanto pode estar o “Campo de Flores” de Drummond, quanto a Floresta de Espinhos da Bela Adormecida. Podemos ver os filhos que não tivemos, o amor que não deixamos aflorar, as canções que não compusemos, os botões que não germinamos, as paixões que não vivemos, as árvores que não plantamos.
Gastamos uma vida inteira buscando esse portal que tomamos como último e para quê? Esquecemo-nos das outras portas que o precedem, das ante-salas mais ou menos arejadas, mais ou menos amplas. Dos olhares com que cruzamos, dos livros inteiros que deixamos de ler,das mãos que nos afagam, fonte de sensações infinitas, dos adamascados e aveludados que acariciam nossa pele. Não colhemos os frutos, os pomos, não bebemos do vinho, não comemos do pão e queixamo-nos porque sabemos a bolor. Talvez por isso a sétima passagem acabe por se revelar apenas decepção para tantos.

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