Saturday, June 17, 2006




Post-Mortem
(Luz... Porto)

Exausta, após ter tombado, ultrapassando o chão
Que amparou o meu cadáver,
Imergi num mundo para além do espelho.
Não havia coelho branco, nem gato, nem biscoito mágico.
As coisas não estavam às avessas:
O avesso das coisas era eu mesma:
Eu, avessa a tudo, avessa à vida, avessa ao amor.
Atrás do espelho as coisas não eram tortas:
A torta era eu, com alma torta, genes tortos, torto DNA.
Meu desejo torto foi o que me levou para o reverso
Desse verso controverso.
Por causa dele a Rainha de Copas
Mandou me deceparem a cabeça,
Furou-me o peito com suas longas unhas vermelhas
Só para que meu ralo sangue azul
Jorrasse rubro por sobre as tábuas claras,
Manchando-as de profundo escarlate.
A cruel soberana invejava-me a pena, a lira,
Ou, quem sabe, aqueles parcos fios alvos e sem cor.
Naquele mundo sem vida, sem morte
Para além do bem e do mal
Ficou meu sorriso congelado num esgar.
A máscara mortuária não coube em mim.
Quebrou-se o espelho
E quedei-me exangue, exaurida
Num limbo onde não há esquecimento, nem memória
Ao qual fui sentenciada
Sem julgamento, sem apelo, sem perdão.

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