Wednesday, April 27, 2016

QUE MISTÉRIO TEM CLARISSE?


(Luz... Porto)









Minha vida é povoada por três Clarices. A primeira, aquela da música de Caetano Veloso "E lentamente despiu o corpo moreno"... Conheci-a em criança e fiquei anos cobiçando aquele LP fantástico que eu gravara em gravador vagabundo. Sempre me perguntava:"Quem é essa Clarice?", "Que mistérios tem Clarice?
Na adolescência, deparei-me com a Clarice Lipector. Não a do "Mistério do Coelhinho Pensante". Tampouco a Clarice de "Laços de Família", que pouco entendi em um primeiro momento. A Clarice de "Perto do Coração Selvagem". Tola, eu supunha que o meu coração fosse selvagem...
Já adulta, em uma liquidação de loja de discos, de LPs, deparo-me com um vinil bonito. Na capa vermelha, lia-se em letras brancas o nome "clarisse". Em minúsculas, se não me engano. Na época trabalhava em quatro escolas, uma do Estado, cuja remuneração só viria a receber seis meses após a contratação. Tinha de ser criteriosa naquele vasto mundo de possibilidades. Insisti. O repertório pareceu-me bom, embora não conhecesse todos os compositores. A última faixa do lado A, se não me engano, era Capricho e as duas últimas do lado B eram Filhos do Verão e Terra do Fogo. Que têm em comum? Todas da 
Sueli Costa. Parcerias com Abel Silva, Capinan e Tite de Lemos, respectivamente. Pronto. Não poderia haver melhor selo de qualidade para mim. 
Levei-o para casa como se fora um troféu. E era. Não parava de ouvir o disco e de repetir as perguntas da infância:"Quem é essa mulher"? Não frequentava a noite carioca na época. Só ia a shows em determinadas casas noturnas, Canecão, People, Jazzmania, Mistura Fina e a câve do Meridien, além do saudoso Duerê, em Niterói. Meio coisa de coxinha, talvez. Mas não era preconceito. Era falta de informação.
Um dia li no jornal que Clarisse se apresentaria na sala Funarte, ou algo parecido, com o Nonato Luiz. Obriguei uma amiga a ir comigo. Ela se queixou. Era sábado, perigoso o Centro do Rio (imaginem agora). Fomos. Foi a primeira vez que vi Clarisse. Forte impressão ela me causou. Minto. Já causara. Assim que comprei o LP, tratei de gravá-lo em K7 para poder levar a fita em viagens. Viajamos muito, eu, meu walman, o K7 da Clarisse, outro do 
Zé Luiz Mazziotii,  um terceiro da Joyce Moreno, um quarto do João Bosco e mais um do Sebastião Tapajós. Cruzamos o Brasil de sul a norte. Deus foi bondoso e as fitas não arrebentaram.
Anos mais tarde, Clarisse gravou uma das faixas do CD de 50 anos do Aldir Blanc e participou daquela festa maravilhosa e irrepetível no Canecão. Vieram NOVOS TRAÇOS, sobre obra inédita de Aldir Blanc, SUPER LISA, com 
Felipe Radicetti, QUE TAL?, com Afonso Machado e PREMONIÇÕES com Fred Falcão.
Participou do grupo MULHERES DE ANTENAS com 
Ninah Jo e Telma Tavares, acho que havia mais uma, e substituiu com louvor Ana Zinger, na composição do saudoso NÓS QUATRO, com Celia Vaz,  Marcio Lott e Fabyola Sendino.
Descobri a compositora. Volta e meia tem coisa nova, e boa, no soundcloud, às vezes no youtube. Aguardamos um CD autoral, Clarisse. Queremos ter o registro desse lado que o grande público desconhece ou mal conhece. E queremos surpresas, novidades.
Sei que você as tem e as guarda em algum canto, da casa, do computador, do coração. Mas para sabermos seus mistérios é preciso em primeiro lugar, ouvi-la. Ouvi-la muitas vezes. Nos deliciarmos com sua interpretação personalíssima para depois enterdemos porque 
Carlota Marques e outros se referem a você como "La Grova". 
Parabéns, 
Clarisse Grova, e que Deus continue a abençoá-la e a esta VOZ.