Tuesday, October 27, 2015


TRAVESSEIRO DOS MEUS BRAÇOS...


(Luz... Porto)



Quem não tem amigo no Face que não sonha nem delira junto não sabe aproveitar o Face. Quem só posta notícias, coisas sérias, está perdendo muito da graça de alçar voo e pairar por sobre a realidade inóspita que nos pesa e faz chorar muitas vezes. Sim, pois quem não sabe brincar largou parte da sua infância, não a cronológica, mas o espírito de se ter uma criança interior, lá atrás.
Prefiro passar por "iludida", "retardada", "dessa gente que só posta bichinhos" a abrir mão da diversão, quiçá tola, de imaginar coisas, viagens, planos irrealizáveis (Serão?). Já me disseram que é um absurdo uma pessoa inteligente perder tempo com testes de Facebook. Eles podem ser tão divertidos...
Nessa minha viagem tenho companheiras sérias, compenetradas, que me ajudam a montar minha casa. Casa que será compartilhada com elas e que abrigará hóspedes, passageiros ou agregados. Os detalhes vão surgindo e a cortina de névoa e mistério que a cerca vai sendo desfeita.
Já temos nossos cantinhos, algumas vistas, pias de banheiro, mesas para refeições ao ar livre, algumas janelas.
"Não é assim que se constrói uma casa", arquitetos e engenheiros hão de dizer. "É assim que a nossa é feita", contraponho eu. Nossa casa vai sendo plasmada aos poucos. Com carinho, mãos de fada. Até eu, desprovida de talentos manuais e decorativos, dou meus pitacos.
Já temos jardins, cantinhos, fontes, árvores. Inclusive as impossíveis. Sobretudo as impossíveis... E uma variedade de flores, de todas as cores e climas. Nossa casa ensolarada por um sol temperado conhecerá a beleza das quatro estações e até neve teremos. Cada uma com sua beleza e seu perfume. E como há de ser perfumada a nossa casa! Lavanda, alecrim, canela, lírios, rosas...
Uma casa se faz antes pelo amor das pessoas que a habitam do que pelas paredes que a protegem. Sonhemos, pois...



AQUELE QUE CONSIDERA A SAUDADE 

UMA MERA CONTRALUZ....

(Luz... Porto)




Hoje faz um ano que uma amiga muito querida nos deixou. Deixou todos nós mais tristes, mais vazios, mais perplexos. Marido, família e amigos. Amigos... Ela os tinha em quantidade. Melhor, ela os tinha em qualidade. Pois não é que a danada fez amizades até pelo Facebook? Mesmo sem ter nunca ouvido-lhe a voz, Sílvia já planejava estar aqui em Niterói este ano para comemorar meu aniversário. E convidara Marisa Dea e Val Belisario.
Meu aniversário veio, passou, e nada. Acho que estou sendo injusta. Acredito que ela tenha me visitado. Lembro-me de um perfume, um chá na sala, ainda desarrumada. De risos, leveza, mimos. assim era a Sílvia. Sempre atenciosa, bem-humorada, gentil e atenciosa. Gostava de poesia. Era fã do André Bolívar, nada mais natural. Dizia-se minha fã. Em nossa última conversa inbox ela se queixara de que meus poemas - ela os considerava poemas! - escasseavam-se Cobrava-me a publicação de um livro, sonho acalentado, que julgo distante. Calma, Silvia. Quem sabe não consigo?
Pus-me a pensar na saudade. Sílvia nos faz falta, sim. Vêm-me os versos finais de Genipapo Absoluto, música do Caetano que considero genial. "Aquele que considera a saudade uma mera contraluz que vem do que ficou pra trás, não, esse só desfaz o signo e a rosa também". Você não ficou pra trás, Sílvia. Você está trilhando outros campos, visitando outros lugares. A "Rosa Mística", creio que você esteve com ela e a contemplou em seu esplendor. E que você segue sorrindo, aprendendo coisas novas, talvez velando um pouco por nós que ficamos. Certamente espargindo suas delicadezas e flores.
Um beijo, com muito carinho, a você que me provou que podemos ser amigos daqueles que nem chegamos a conhecer face a face,
Luzia Luz.


https://www.youtube.com/watch?v=omvX8nImDNU

PRA VOCÊ QUE ME ESQUECEU...


(Luz... Porto)




Depois de uma “longa temporada no Inferno”, sem ver o leonino Caetano, consegui, muito por acaso, ir assisti-lo. Com o incidente bastante desagradável do show da Bethânia, no qual ruído na comunicação fez com que o que julgara mais do que confirmado não o fosse, ficando eu a “ver navios na imensidão”, realmente desistira de ir a shows com vans. Quis o destino porém que eu visse uma postagem da Sonia anunciando dois ingressos para o show de ontem, 24 de outubro. Peguei do celular e confirmei a minha ida.
Fomos em um pequeno grupo de sete, “As Sete Mulheres”, rumo ao Via Parque. Tão distraída estava eu que nem percebi que saíamos cedo para o Metropolitan e não para o Vivo Rio. Encontro uma Barra que definitivamente não era mais a Barra de outrora, nem aquela de três ou quatro anos atrás. Primeira decisão importante: onde e o que comer. A sugestão do Cervantes foi bem aceita. Não tanto por mim, que preferia outro cardápio, mas impossível resistir a uma outra filial daquele que fora o fim de noite em Copa. Sanduíches enormes, com a “inovação” do abacaxi misturado ao tender e ao lombinho. Servidos, muitas vezes no balcão. Começou assim minha viagem no tempo, essa ilusão da qual não escapamos.
Conversa vai, conversa vem, me dou conta de que minha primeira ida ao Metropolitan se dera nos anos 90 com a mesma Aparecida, colega de Cultura Inglesa e CELEMO, para vermos... Caetano e Gil! Tropicália 2. Um showzaço, “visto” da última fila de uma casa absurdamente grande, para os padrões do Canecão, em uma época quando, acho, nem usávamos a Linha Amarela.
Mas vamos ao show. Já o tinha visto pela televisão. Mal-humorada, não o achara grande coisa. Despeito por não estar lá, suponho, ou esquecimento. Esquecimento d que é um show de Caetano. Mais ainda, um show de Caetano acompanhado. As muitas bandeiras no palco me pareceram pretensiosas. Os primeiros acordes do violão, sim foi um show de voz e violão, derreteram a minha capa de pseudo crítica e a Luzia de antigamente, aquela apaixonada por shows, que movia céus e terras para vê-los, deu o ar de sua graça, remoçada. A mesa descontraída e com um astral ótimo que acabou se formando contribuiu para meu deleite e para que eu cantasse quase todas, exceto umas quatro ou cinco, junto com os dois e com, suponho, uma enorme parte da plateia, contrariando o que Alexandre Lemos dissera a respeito de assistirmos a shows quietos e compenetrados. Bem... conversas paralelas não houve.
Não foi apenas uma euforia que senti. Senti-me acalentada com as canções que foram sendo desfiadas nas cordas dos violões plangentes e modernos. Entreguei-me tanto ao espetáculo que não sou capaz de reproduzir as canções que ouvi. Entreguei-me tanto que, um hábito antigo, ressurgiu. Por vezes semicerrava os olhos embevecida com a poesia e a sonoridade e abstraía a imagem. Eles estavam, sim, tocando para mim em um encontro harmonioso de dois grandes amigos de longa data. A casa de shows era apenas uma extensão, bem grande, mas acolhedora, da sala de estar de um deles.
Cada música me remetia a uma época da minha vida. A uma época afetiva. Amigos e namorados estiveram a meu lado sem – pasmem! – mágoas. Sou “boazinha”, mas tenho essa pequena dificuldade de esquecer, de perdoar. “Não há o que perdoar, por isso mesmo é que há de haver mais compaixão”. E, dura que sou comigo, compadeci-me de carregar ainda, lá no fundo, algumas lembranças ruins. Elas se foram, ou foram dar uma volta por aí, e fiquei bem mais leve. Foi um espetáculo leve, a despeito de músicas comoventes como Tonada da Luna Llena , ou densas como Terra , Drão, e uma em que o Gil fala do medo da morte, contrapondo-o ao medo de morrer.
Fiquei seduzida com a voz de Caetano, fascinada com os violões e comovida com o Gil. Tudo de uma simplicidade tão grande que há de ter exigido um grande preparo dos dois. Que cantaram ininterruptamente, sem aparentar qualquer cansaço. Aí me dei conta de que uma dor que se iniciara no show Zii e Zie, há uns cinco anos, poderia ser purgada. “Cantando eu mando a tristeza embora”, já dizia a música que, segundo João Luiz de Souza, seria a “letra imprescindível da canção brasileira”, de acordo com Miele. Tomara eu mande a minha para bem longe. Esse show pode muito bem ter encerrado um ciclo deflagrado em função de uma série de contratempos do último. Afinal, “a fé não costuma faiá”. A minha andou eclipsada por névoas espessas, mas, dizem, está bem presente na minha carta natal.
Digressões à parte, os amigos e namorados não passaram por minha mente ou coração por mero acaso. Lembrei-me mesmo daqueles com quem a relação passava pela MPB. Dos que apreciavam Chico, Gil e Caetano. Bateu solidão. Não, não por ter ido relativamente só. Antes por ter desejado partilhar aquele momento com alguém significativo. Pasme, coração, pasmem, infiéis, que julgam que eu escolheria um amor, mesmo sabendo que “amores do passado no presente repetem velhos temas tão banais”. Mesmo lembrando de um amor que me mostrou outros trabalhos do Caetano. Mesmo ciente do esquecimento a que ele me condenara, mandei-lhe apenas um abraço.
Senti mesmo foi falta do Zé Carlos. O Zé, aquele amigo escorpianamente escorregadio, que não quer tanto contato, alegando que este poderia causar novo estremecimento ou afastamento. O Zé que sempre foi extremamente feliz ao me presentear com pérolas que eu não conhecia, como O CAVALEIRO DAS TREVAS e o DISCO DE BOLSO do PASQUIM, ou com outras que há muito desejava, como o LP CHICO E CAETANO, no Teatro Castro Alves e a inseparável BÍBLIA DE JERUSALÉM, das Paulinas. Ora, Zé, a ampulheta escorre e você não precisa ser tão cruel impondo sua ausência. Deveria tê-lo chamado. Seria seu presente de aniversário. Convite que, minha intuição sussurrou antes mesmo que eu chegasse a elaborar o pensamento, você provavelmente declinaria. Você, como de costume, foi o primeiro a me chamar atenção para certos versos de Drão e de Se eu quiser falar com Deus. Vou dizer mais uma coisa. Mesmo acinzentada, a manhã nasceu azul. Como é bom ter a alma tocada por um instrumento...