Saturday, May 21, 2011


Pessoal e Intransferível

(Luz... Porto)

Nestes versos sem rima,

No poema sem ritmo,

Meu coração arrítmico se espraia.

Nesta ode sem metro,

No metro quadrado de meu corpo,

Eu, ectópica, desterrada estou.

Em minha cantiga sem amigo,

Sem amor, sem escárnio, só tédio,

A passagem das horas se demora.

Tênue linha que separa meu Rio do teu,

Onde o pôr-do-sol, lânguido, se alonga,

Mas em que não me banho,

Rio que não mais visitas.

Neste meu corpoterritório

A cartografia do desejo

Não passa de borrões desbotados

A desenharem um jardim de delícias

De que pouco desfrutaste.

Meus vales de onde jorram leite e mel

Secaram com teu descaso.

E se foi isto o que o Acaso quis

Pouco se me dá neste ocaso:

Sou eu esta morta-viva

Que no Letes se afogará.


Ulisses

(Luz... Porto)

Bardo cego

A quem as Musas a visão tomaram,

Sei que pouco vês.

Mas bem mais que meus olhos cansados

Consegues fazer.

Vate sagrado

De cuja existência alguns duvidam,

Bem sei – e como!- o quanto existes

Mas nesse meu degredo

Às vezes penso que de alma penada

Não passas.

Eu, sem-terra, sem-amor, sem-filhos,

Expatriada desde antes do ventre materno,

Em ti vislumbrei minha remota Ítaca.

Icei âncoras, inflei velas,

Embriagada rumei para teus braços.

Porém, Circe que eras,

Em felino me transformaste.

E hoje sonho a vida que não tive

Ou vivo o sonho a que me condenaste.



Abduzida
(Luz... Porto)
Meu dileto vate,
Por que em vão te abates?
Não sabes que o querer
Nem sempre é poder?
Larga os teus ciúmes,
Deixa de queixumes,
Vem cá nos meus braços
Te perder em meus abraços.
Brinquemos, folguemos, mão na mão,
Enquanto , curto , nos dura este verão.
Se minha rima é pobre,
É que minh’alma se recobre
De casto pudor. Rubra, pueril,
Nunca sabe ao certo ser sutil.
Toma-se de pejo
E afoga o seu desejo.
Prefere, parva, se calar
Ao coração deixar falar.
Se a ti não cabe a posse
Pra que a alma se renove,
Vê que, mesmo de ti cativa,
A mim não me pertence minha vida.