Friday, August 11, 2006


NAUFRÁGIO
(Luz... Porto)
Estranho magnetismo
À sombra da Gabriela Sabatini em flor
Fixa o teu olhar à minha pessoa.
Já estiveste em mim,
Já foste meu companheiro
De noites esparsas,
Encontros fortuitos.
Teu olhar são muitos
Mas só um deles é meu.
Meus olhares múltiplos
São apenas um
E ele é teu.
Tua imagem já fôra gravada
A ferro e fogo
No fundo de minhas retinas esmaecidas
E teu cheiro, teu gosto, teu toque
Correm em minhas veias
Há mais tempo do que eu
Poderia admitir,
Do que a prudência recomendaria.
Não sou tua.
Não és meu.
Mas continuas a me mandar
Sinais de fumaça,
Garrafas vazias
Que eu recolho em minha ilha
Todas as noites
Mesmo sem poder decifrar.


OÁSIS
(Luz... Porto)
Estrelas no céu,
Estrelas em teu olhar
Parecem refletir apenas
Os sóis que me povoam a alma.
Sol roxo, lua negra...
Sóis meus, só meus...
Teu sorriso idiota
Estampado no rosto
Jovial e alegre,
De uma alegria um tanto contida,
Parece me dizer "Eu te amo".
Eu, tola romântica,acredito.
Crio a ficção de que estou em ti
Como sempre estiveste em mim.
Acredito em tuas mãos,
Em teu corpo, em teu desejo.
Acredito para não sucumbir,
Acredito para dar um sentido
À falta de senso
Em que mergulho minha vida.
Finjo crer no ressurgir da chama,
No reacender da brasa adormecida.
Finjo não me saber estrada secundária,
Oásis ocasional,
Refúgio intermitente
Que sempre estará lá
À tua espera,
Embora eu já não possa
Esperar mais nada...
Tenda no deserto
Em que tu, nômade errante,
Sedentário por vocação,
Pernoitavas com a freqüência
De um círculo completo de Saturno.
Talvez precises de mim
Para teres um passado onde te abrigar,
Para te consolares
Com a vida que poderia ter sido mas não foi.
Para que o não-vivido dê um colorido especial
Ao tédio e à solidão
Que acabaram povoando tuas noites
Sem luar, tornadas vazias
Por um capricho dos deuses
A rirem de nós no topo da escadaria
Enquanto nossas almas se espatifam
Desoladas nas lajotas da casa assassinada.

Tuesday, August 08, 2006



INTENSA
(Luz... Porto)
Insaciável, irascível, irracional,
Porém inebriante e inefável
Esse desejo premente
Que me toma o corpo, as vísceras,
O pensamento, as sensações.
A urgência que nunca se satisfaz,
Que nunca cessa, que grita muda,
Em meu peito acelerado
É o que me torna
A mulher que não sou:
Rosto tranqüilo, poucas marcas do tempo,
Mãos ternas e firmes para o carinho.
Abraço de mãe, de madrinha.
Corpo bem-comportado
Insinuando-se, de leve, por dentre
Fendas, decotes, transparências.
Cabelo arrumado, ar respeitável.
Pois a mulher que sou,
Puro impulso, puro instinto,
Essa mulher primitiva, selvagem,
Feixe de nervos, músculos e artérias,
Voz, suor, sangue e lágrimas,
Pode te assustar de vez
Por te parecer indomável
E fazer com que te afastes de mim para sempre.


METAFÍSICA
(Luz... Porto)
Despe-te, ó minh'alma.
Larga para trás todo o brocado,
Toda a seda, todo o cetim
Que há pouco cobriam tua pele
E mergulha sem pejo
Neste abismo de ternura
Que é o teu par.
Deixa que teu corpo
Se entregue de vez
À paixaõ que te toma cega,
Ao desejo que te persegue surdo
E compreende de vez
Que teu destino é ser mulher.
É o de sofrer por amar demais.
É o de ser essa loba solitária
Que, no escuro uiva para a lua,
Não para chamar o companheiro,
Mas, antes para gritar ao mundo e aos deuses
Que ainda está viva e pulsante.